Camarate: CDS-PP considera que poder político já fez tudo o que podia
O líder parlamentar do CDS-PP sublinhou hoje só o poder judicial poderá avaliar a confissão do ex-segurança José Esteves, que a firma ter preparado um engenho que alegadamente fez despenhar o avião que matou Sá Carneiro e Amaro da Costa.
"No que toca ao poder político, o que havia a fazer está feito. Já nos substituímos durante muitos anos ao poder judicial", afirmou Nuno Melo, reagindo à entrevista do ex-segurança José Esteves à revista Focus.
"As provas estão aí. Resta apenas pegar nelas e realizar um julgamento" , acrescentou Nuno Melo, que presidiu à última Comissão parlamentar de Inquérito sobe Camarate.
Para Nuno Melo, a entrevista de José Esteves "é um facto relevante mas não significa só por si a existência de um crime".
"É um facto relevante que deve ser avaliado, mas só pode ser avaliado por um tribunal", disse.
A edição de hoje da revista Focus, que entrevistou José Esteves, refere que o antigo segurança do CDS, assume agora que foi o autor de uma bomba incendiária que terá provocado a queda do avião mas que o seu plano era apenas pregar um "susto" ao general Soares Carneiro, candidato presidencial pela Aliança Democrática (AD).
José Esteve diz também que o engenho incendiário que preparou foi alterado por forma a provocar a morte dos passageiros do Cessna.
A explosão da aeronave Cessna, no bairro de Camarate, a 04 de Dezembro de 1980, provocou a morte do então primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro, da sua mulher Snu Abecassis, do ministro da Defesa Adelino Amaro da Costa, do chefe de gabinete do primeiro-ministro António Patrício Gouveia, assim como dos dois p lotos do aparelho.
Nuno Melo recordou que a última comissão de inquérito sobre o caso, a oitava, concluiu pela existência de "fortes indícios da prática de um crime em Camarate".
"Foi o próprio Procurador-Geral da República que o afirmou, em carta dirigida à Assembleia da República, dizendo que os indícios justificavam que o caso fosse levado a julgamento, o que só não sucedia por razões processuais", friso u.
Em termos judiciais, o caso prescreveu em Setembro deste ano e, apesar da confissão, José Esteves nunca poderá ser julgado.
Existe apenas a possibilidade de o caso ser apreciado por instâncias europeias, já que o advogado de alguns familiares das vítimas, Ricardo Sá Fernandes, assegurou que vai apresentar, em Janeiro, junto do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, uma acção em que pede a condenação do Estado português "a uma indemnização simbólica de um euro" às famílias das vítimas.
Nuno Melo manifestou ainda a sua esperança de que os "partidos do arco da governabilidade, PS, PSD e CDS-PP" possam chegar a acordo sobre uma alteração da lei que permita que o Parlamento "não fique de mãos atadas" sempre que concluir pela existência de indícios fortes de crime, uma discussão que decorre no âm bito da revisão do regime dos inquéritos parlamentares.
"PS, PSD e CDS-PP têm que chegar à melhor solução que não ponha em causa a separação de poderes mas que assegure que exemplos como os de Camarate não possam voltar a suceder", frisou.
Referindo ter em mente o caso Camarate, o PSD propôs há duas semanas que seja obrigatória a acusação pelo Ministério Público quando o Parlamento apurar indícios de crime do qual tenha resultado a morte do Presidente da República, presidente da Assembleia da República ou primeiro- ministro.
O CDS-PP sugeriu uma solução idêntica que abranja, além dessas figuras, os membros do Governo, assumindo estar a pensar especificamente no falecido min istro da Defesa Adelino Amaro da Costa.
Por sua vez, o PS propôs que não só esses crimes, mas outros, como os de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, sejam levados a tribunal, "em caso de arquivamento ou despacho de não pronúncia", por um "Procurador Especial", com estatuto idêntico ao do Ministério Público, nomeado pelo Parlamento.
A solução do PS é rejeitada pelo PSD, mas os socialistas garantem que irão fechar o dossier da revisão dos inquéritos parlamentares na próxima semana, com ou sem consenso, sem revelarem se irão manter ou deixar cair esta proposta do Procurador Especial.